Um
alguém qualquer se sentou numa mesa e esperou que a garçonete lhe atendesse.
Ela demorou um pouco para atendê-lo, sabe-se lá por que. O alguém olhou em
volta e viu que o ambiente estava cheio. Deve ter pesando que esse era o motivo
do atraso.
Depois de alguns minutos esperando,
ele resolveu levantar-se. Andou até o balcão e fez o pedido alí mesmo. Quando
voltou a sua mesa viu que já estava ocupada por outros dois alguéns. Ficou
puto. Voltou ao balcão e pediu para que lhe arrumassem uma mesa. E foi
atendido.
Não demorou muito para a garçonete
lhe trazer o pedido. O alguém pareceu se sentir um pouco ofendido com o modo
como a garçonete lhe serviu e fez cara de bravo. Ela não deve ter prestado
muita atenção nisso. Então o alguém fez uma cara ainda pior que a anterior, mas
não pra garçonete, que já corria para atender outros alguéns.
O alguém virou-se pro lado e fez
alguns comentários com outros alguéns da mesa ao lado. Disse algo sobre o
atendimento alí ser muito ruim, sobre a garçonete estar mau humorada, sobre
como se deveria atender um cliente, sobre como ele era atendido em outros
estabalecimentos mais nobres, sobre como ele se revolta contra a falta de
educação e dedicação das garçonetes. Os outros alguéns que ouviam concordaram
monossilabicamente.
Mas contra o que se revoltava o
alguém? Ele deveria estar puto com o fato de ter perdido a sua mesa para outros
alguéns que não a mereciam. Ou deveria estar puto mesmo com a demora no
atendimento, ou com o fato de ter de levantar-se e ir até ao balcão fazer seu
pedido, perder sua mesa, tudo por causa da demora do atendimento, já que ele
poderia estar atrasado pra um compromisso qualquer, ou com pressa para comer e
sair daquele lugar onde o tendimento era ruim e demorova-se muito pra ser
atendido e as garçonetes eram mal-humoradas.
Pode ser também que ele estivesse
puto com o mal-humor da garçonete. Pra ele talvez não importasse que o
estabelecimento estivesse cheio e a garçonete estivesse muito ocupada. Ou que
ela tivesse algum problema que ele desconhecia, que ela talvez tivesse uma
doença grave, que algo de ruim possa ter acontecido a um de seus familiares,
que seu emprego fosse uma merda, que seu salário fosse ridículo, que ela
tivesse que pegar dois ônibus, um trem, um metrô e ainda caminhar meia hora pra
chegar naquele estabelecimento onde ela era reprimida, mal-tratada, trabalhava
muito, ganhava pouco.
Talvez ele não se importasse com
nada disso. Ele parecia mesmo querer um sorriso dela. Mesmo que fosse um
sorriso falso. Ele parecia mesmo querer um sorriso falso dela.
Ele parecia querer ser o único a
estar alí, o primeiro a ser atendido, o senhor de todas as mesas, o dono da
garçonete. Por que se fosse, ele talvez a obrigasse a sorrir pra ele todos os
dias. Talvez lhe obrigasse a lhe servir todos os dias, em todas as mesas, em
tempo recorde. Talvez lhe obrigasse a transar com ele todos os dias, em todas
as mesas, o tempo todo. Mesmo que os sorrisos fossem falsos, ou mesmo que os
orgasmos fossem falsos.
Depois de comer, ele pagou pela
comida, passou pela garçonete e sorriu pra ela. Ela sorriu de volta. Um sorriso
quase triste. Se distraiu e derrubou uma bandeja. O alguém riu de novo. Parecia
pensar que ela, a garçonete, não servia para servi-lo.
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